Blog do Hektor

https://jornalistaheitormenezes.blogspot.com.br/

quarta-feira, 24 de março de 2021

GUIRLANDA DE FLORES SANGRENTAS/1987 (TERCEIRO LIVRO-MÚSICA DA EDITORA OGMIOS).


O LIVRO-MÚSICA “GUIRLANDA DE FLORES SANGRENTAS” (FEVEREIRO DE 1987) E O FIM DA GRAVADORA ARTE DEGENERADA (JUNHO DE 1987).


Série Fadas (Pinturas, 2002) feita por Marco Alexandre Rosário para o Livro-Música "Guirlanda de Flores Sangrentas", de 1987.


"Guirlanda de Flores Sangrentas", terceiro Livro-Música da Editora Ogmios, de 1987. Na foto, a versão de 1986 (datilografada e manuscrita, e fita cassete) e a versão de 2000/2005, digitalizada e com Cd.


Livro-Música "Guirlanda de Flores Sangrentas"/1987 (Cd 1 - 1o. Volume - na íntegra):

 Link: Guirlanda de Flores Sangrestas/1987 (Livro-Música)


Músicas do Livro-Música "Guirlanda de Flores Sangrentas"/1987:

Link: Prelúdio/1987

Link: A Morte/1987

Link: Whaleia 1987

Link: Lisa Tocando seu Violino em meu Deserto/1987


Série Fadas (Pinturas, 2002) feita por Marco Alexandre Rosário para o Livro-Música "Guirlanda de Flores Sangrentas", de 1987.


O último Livro-Música produzido nos tempos áureos da Editora Ogmios (Seaculum Obscurum)/ Gravadora Arte Degenerada teve como título “Guirlanda de Flores Sangrentas”, e foi feito entre os meses de fevereiro e março de 1987. Com relação às músicas houve uma modificação no método de compô-las: este Livro-Música foi composto, quase que integralmente, na casa de Carla Morrison. Ou seja, dessa vez eu não gravei duas fitas cassetes e trouxe o material para a minha casa para realizar outra gravação, usando três gravadores, violão e outros instrumentos e efeitos sonoros. Quase tudo foi gravado diretamente no teclado. Apenas algumas músicas, que foram gravadas posteriormente, foram gravadas em casa. A música para o poema “Lisa Tocando seu Violino em meu Deserto” foi gravada na casa de Marcelo Lima, com o violão dele. “Guirlanda de Flores Sangrentas” foi talvez o melhor trabalho da Editora Ogmios (Seaculum Obscurum)/ Gravadora Arte Degenerada em termos de música. O material foi gravado numa fita cassete de 45 minutos e teve bastante influência do grupo “Cocteau Twins”, principalmente dos álbuns “Treasure” e “Victorialand”. Em termos de poesia, eu aprofundo a minha obsessão por fadas, baleias, oceanos, etc. O poema “Para Uma Mulher da Velha e Longínqua Ilha Verde, em Transe por sua Beleza – (Canção para uma Imagem)” foi dedicado a Grace Slick, cantora norte-americana do grupo Jefferson Airplane, para mim uma das mulheres mais belas que já pisou a face da terra. Na verdade, os poemas do Livro-Música “Guirlanda de Flores Sangrentas” foram escritos em 1986, e eram, em sua maioria, sobras do Livro-Música “Iluminuras”. Entretanto, os dois Livros-Música não foram terminados em 1986 e 1987. Eles foram completados e terminados somente em 2002. Na verdade, em 2002 foram feitos poucos acréscimos em relação à estrutura dos livros, e foram escritos alguns poucos poemas para completar as duas obras. Tanto o Livro-Música “Iluminuras” quanto o Livro-Música “Guirlanda de Flores Sangrentas” são considerados por mim os dois melhores trabalhos da Editora Ogmios (Seaculum Obscurum)/ Gravadora Arte Degenerada. “Guirlanda de Flores Sangrentas” foi o último Livro-Música da Gravadora Arte Degenerada até o renascimento da mesma, no ano de 2003.

 

Álbum "Treasure", do grupo inglês Cocteau Twins, de 1984, que muito influenciou a Editora Ogmios na concepção do Livro-Música "Guirlanda de Flores Sangrentas", de 1987.

Ainda no primeiro semestre de 1987, eu dei início à produção de mais um livro de pinturas: o “Surrealística II”. Este trabalho não foi inteiramente concluído e seria o último trabalho de pintura da Editora Ogmios até o ano de 2002, quando eu produzi novas pinturas.

 

Álbum "Victorialand", do grupo inglês Cocteau Twins, de 1986, que muito influenciou a Editora Ogmios na concepção do Livro-Música "Guirlanda de Flores Sangrentas", de 1987. Este álbum foi uma grande influência.

O grupo inglês Cocteau Twins, que muito influenciou a Editora Ogmios na concepção do Livro-Música "Guirlanda de Flores Sangrentas", de 1987.

Após eu dar início ao livro de pinturas “Surrealística II”, eu decidi fazer outro Livro-Música. Desta vez, seria um álbum muito mais elaborado do que os anteriores. Infelizmente, não foi possível nem mesmo iniciar este projeto. Em junho de 1987, minha avó Olga Rosário sofreu um devastador derrame cerebral, teve braço e perna paralisados, perdeu quase que por completo a fala e ficou assim numa cadeira de rodas até a sua morte, ocorrida em 2 de setembro de 1998. Devido a este fato, a Editora Ogmios praticamente terminou. Como eu falei acima, em 1969, após a separação dos meus pais, eu fui morar na casa dos meus avós, pais do meu pai. Os meus avós, Dário e Olga eram funcionários públicos do correio brasileiro. Ele nasceu em 1910 e faleceu em 1979; ela nasceu em 09 de outubro de 1909. Em 1983, um tio que morava conosco foi trabalhar no Banco do Brasil, em cidades do interior do Estado do Pará. Assim, passaram a morar na casa eu, a minha avó Olga, a empregada (uma mulher negra, cujo o nome é Deodata e que passou a morar conosco a partir de 1972), duas cachorras e um gato. Uma das cachorras se chamava Laisse e passou a morar em casa desde 1974. A outra, Ana Preta, veio morar em casa em 1978. Um dia, eu vinha do colégio e, quando eu desci do ônibus, na Avenida Almirante Barroso, em frente ao campo de futebol do Paysandu, eu vi uma cachorra correndo com um filhote na boca. A cachorra acabara de dar à luz a três filhotes. Um deles ela levou na boca; os outros dois estavam numa caixa de papelão, que alguém pegou. Eu decidi ficar com os dois filhotes. Passou um homem e pediu para levar um deles. O outro eu levei para casa: era a Ana Preta. Os olhos dela ainda estavam fechados. A mãe de Ana Preta não era uma cachorra muito grande, mas a filha ficou enorme, quase do meu tamanho. O pêlo dela era preto e branco. Ao longo de dez anos, ela jamais rosnou para mim; ela gostava de pássaros e gatos, gosto não compartilhado com a Laisse, que detestava gatos. Uma vez, em 1983, eu cheguei em casa (noite) e a Deodata disse para eu olhar em volta, na cozinha, porque tinha uma surpresa para mim. Eu procurei a tal surpresa e então vi o que era: um gato. Demos a ele o nome de Preto, porque o pêlo dele era preto e branco, como o pêlo da Ana Preta. Nós sempre tivemos vários gatos em casa. “Preto” foi o nosso terceiro e último gato com pêlo preto e branco. Com o passar do tempo ele foi crescendo e nós dois ficamos amigos. Ele gostava de ouvir música erudita (Bach, principalmente)! Assim, em 1983, esses eram os moradores da casa nº 2623, da Travessa do Chaco. Certa vez, um amigo disse que na minha casa só moravam figuras históricas. Foi neste ambiente surrealista que a Editora Ogmios (Seaculum Obscurum)/ Gravadora Arte Degenerada surgiu. Era um ambiente um tanto mágico, como se fosse um conto de fadas. Mas, como todo conto de fadas, havia um lado negro neste paraíso e este lado negro teve início em 1984. Por algum motivo que eu não sei explicar até hoje, desde o ano de 1984 o esgoto da rua entupiu. Quando chovia, a rua virava um oceano, e como a rua tinha sido asfalta em um nível acima da nossa casa, a nossa casa começou a ir para o fundo toda as vezes que chovia. Ou seja, a água da chuva, misturada com lama e com a água do esgoto invadia a casa. Por mais incrível que possa parecer, até hoje esse problema não foi resolvido. Olga já tinha tido um problema em 1975, e ficara proibida de subir a escada que levava ao andar de cima da casa. Em 1985, após a morte do filho mais velho, ocorrida em Brasília, ela teve um pequeno derrame cerebral que afetou as pernas dela. Desde o ano de 1983 eu passei a dormir no quarto dela. Eu tomava conta dela e nós conversávamos muito. Ela conheceu pessoalmente dois presidentes da República: Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek. Também tínhamos momentos de depressão, principalmente após uma enchente. Falávamos até em suicídio coletivo. Evidentemente, não tínhamos coragem para tanto. Uma vez, em 1987, começou a chover em plena madrugada e em menos de meia hora a casa estava inundada. Eu levei Olga até o meu quarto, no segundo andar da casa, fui até o quintal e soltei Ana Preta e a levei também para o meu quarto. Algum tempo depois alguém começou a arranhar a janela do meu quarto: era o preto, o gato. Todos dormiram no meu quarto naquela noite, após eu mostrar a eles os trabalhos da Editora Ogmios. O problema do derrame cerebral que aleijou Olga para sempre começou a ocorrer em fins de maio. Ela começou a sentir dores de cabeça e tonturas. Chamei o médico. Antes do médico chegar, minha mãe, que era estudante de medicina, apareceu lá em casa, examinou Olga e deixou um bilhete para o médico dizendo que Olga estava fazendo um quadro de derrame cerebral. Quando o médico chegou em casa, leu o bilhete e disse que o problema não era o indicado no bilhete, e sim uma simples faltar ar (dificuldade respiratória). Ele receitou algumas sessões de aerossol. Durante três dias, eu levei Olga religiosamente ao hospital para as sessões de aerossol. No terceiro dia, por volta das 07:30 horas da noite, Deotada apareceu no pé da escada gritando para mim descer com urgência, porque Olga, que estava assistindo televisão, não conseguia falar. Naquele exato momento, eu estava ouvindo o Sgt. Pepper’s, do Beatles (por pura ironia, a música A Day in the Life). Fazia vinte anos que este álbum havia sido lançado. Desci a escada e encontrei Olga tentando falar e sem movimentos no braço direito. Depois reparei que a perna direita também não se movia. Telefonei para a minha tia, o marido dela apareceu na porta de casa após uns 10 minutos. Carreguei Olga nos meus braços até o carro e a levei para o hospital. Ela foi internada na Unidade de Tratamento Intensivo. Ela ficou lá durante quatro dias, entre a vida e a morte. Eu enlouqueci com aquela situação. A Editora Ogmios (Seaculum Obscurum) / Gravadora Arte Degenerada tinha acabado ali mesmo, por uma série de motivos que aqui não cabe enumerar.


Série Fadas (Pinturas, 2002) feita por Marco Alexandre Rosário para o Livro-Música "Guirlanda de Flores Sangrentas", de 1987.


hhh

 

GUIRLANDA

 DE

 FLORES

 SANGRENTAS

 

MARCO ALEXANDRE

DA

COSTA ROSÁRIO

 

%

%ÿPOESIA, MÚSICA &PINTURA¯%

%

 

Um Livro-Música da

 

EDITORA OGMIOSE

(SEACULUM OBSCURUM)

 

*BLITZBUCH*

1987



SUMÁRIO

  

PARTE I.

  

PRELÚDIO.

(MONNA EM SEU LEITO DE MORTE)

 

 CORDÕES DE PRATA & OURO.

 

 O ANTIQUÁRIO.

 

 A MORTE.

(Soneto XXVII)

 

 

PARTE II

 

 FADAS.

(Quatro pequenos sonetos)

a) O Brilho Cintilante.

b) O Lago.

c) As Lágrimas e as Delicadas Asas.

d) Os Vôos.

 

WHALEIA.

 

CRIANÇAS DE CRISTAL.

 

PARA UMA MULHER DA VELHA E LONGÍNQUA ILHA VERDE, EM TRANSE POR SUA BELEZA.

(Canção para uma Imagem)

 

LISA TOCANDO SEU VIOLINO EM MEU DESERTO.

 

ADÁGIO

 

 

 

PARTE I

 

  

PRELÚDIO

 

(MONNA

          EM

                SEU

                     LEITO

                               DE

                                     MORTE)

 

“quando eu morrer...

enterrem-me em uma lata de lixo

com garrafas vazias, muitas garrafas vazias,

e frascos de perfume barato,

nos muros de Santa Isabel,

e deixem-me amamentar moscas e ratos em paz”.

 

essa, sua última vontade,

 

querida monna, filha das sombras da tarde na padaria,

que bebia água da fonte do esgoto,

em frente ao mercado de ferro,

  

morta em 13 de abril de 1977...

 

ash can,

 

                                      ash can,

 

                                                                            ash can,

 


CORDÕES DE PRATA & OURO

 

o fino túnel de vidro

ia do paraíso ao inferno,

estabelecendo estações nos tubos de esgoto,

em pequenas correntes de ar,

no corredor mental do anão.

 

uma encantadora senhora                                     fino túnel de vidro;

nasceu de uma concha                                           algumas dançarinas,

dentro de uma revista proibida,                             jovens e belas ciganas,

uma explosão de seios ocorreu,                             germinando movimentos...

eletricamente falando,                                            alcatrão!!!

nos olhos do explorador televisual.

 

e a menina oriental corria nua,

um tapete de queimaduras na pele macia,

enquanto os filhos do imperador

olhavam para os lados

germinando nas bombas.               “une femme”, um mercador de poemas falou;

                                                         “uma constelação de livros antigos

                                                           no ferro-velho”, recitou o louco

                                                           nos interiores e interiores e interiores

                                                           de seu cérebro.

 

rei dos cogumelos, amante da jardineira,

costumava devorar sepulturas no inverno

em cemitérios de abelhas.

 

                                             “ajude-me! Quero ainda viver neste inverno,

                                               nos túmulos de vidro,

                                               amando ‘une femme’ e seus livros antigos

                                               de finos cordões de prata e ouro”,

                                               um relâmpago no corredor mental do anão.

 

“um luxuriante vaso oriental com as queimaduras da menina te ajudariam?”

um pensamento nas estufas do rei dos cogumelos.

“talvez. mas o programa que estão passando é de prata e ouro no espaço”

outro relâmpago no corredor mental do anão.

 

  

o último Bosque Imaginário

 

o fim da tarde desceu sobre o bosque, desceu sobre mim,

desceu sobre ti, e os ruídos da rua envolveram o jardim,

pequenas imagens vêm e se vão no rio da linguagem,

mas o verde é azul e o azul é verde... isso já sabemos,

enquanto nós desejávamos saber o que havia atrás da roupa

da professora...carícias de flores nos espinhos.

 

no jardim, duas meninas caminhavam nuas...

a fria mão do vento acariciando seus corpos,

mas nenhum de nós tocou em suas almas.

no canteiro das  televisões encontramos alguns heróis

e durante a noite estávamos escondidos no banheiro com a mulher gato

e ninguém podia saber da nossa relação secreta.

 

um milhão de cordões de prata & ouro

 

pétalas líquidas desciam pelas janelas da rua

e monges negros  regavam meus olhos no quarto escuro

cheios de monstros sinistros, e diziam:

colher colheres de sangue não é pecado!!!

 

um milhão de cordões de prata & ouro

 

e já estávamos dentro da Apolo 11 numa viagem a lua

fumando escondido no interior da nave! Ih! Ah! Ah!

e  de  volta à  terra encontramos Alice e seu coelho falante

que gostava de consertar relógios sem defeitos

num campo de jogos de xadrez onde o rei e a rainha eram seus vassalos

e ele nos contou todos os segredos de todos as rainhas.

 

e fingindo de cachorro, entramos nos antigos jogos

de achados &  perdidos dentro da loja de filtros do português

e Alice disse: vamos brincar... e tirou a roupa!!!

E nós em coro: que brincadeira legal!!!!

e Alice tirou um grande lençol azul de seus olhos

e vestiu todo o imenso campo.

 

entrem, vamos! entrem todos!!! gritou ela.

e nós entramos e caímos por um grande túnel

e caímos em outro campo, maior que o primeiro,

e nele havia uma casa onde se lia na porta: Casa das Crianças Rebeldes,

Casa das Crianças Feridas pelo Ódio das Crianças do Amor,

que é a melhor casa da infância,

e Alice disse outra vez: vamos entrar e saberemos tudo...

entramos e todos estavam lá e era uma grande festa

de aniversário e quatro músicos tocavam encima de um grande bolo...

 

lojas de brinquedos, revistas proibidas, cigarros,

vinhos e etc... etc... etc...

estavam todos dentro da Casa das Crianças Rebeldes

enquanto Snoopy negociava uma nuvem de fumaça com um guarda

 

feliz aniversário aos cemitérios encantados! gritou a princesa de cima

de seu Castelo de Uvas.

 

vamos dar uma festa para eles, disse a sorridente senhora onça.

 

e bateria e flautas  e guitarras  e gaitas e violinos

e pratos e cravos romperam  ouvidos e ouvidos

e a banda verde construiu uma melodia sonhadora.

 

quando a música acabou todos saíram da Casa das Crianças Rebeldes

e ninguém mais era criança e cada qual seguiu seu caminho

o azul dourado flutuou no verde escuro

& a carruagem noturna entrou nos campos

semeando noites entre criaturas iluminadas.

minhas canções o pássaro da manhã levou,

minha caixa de magia ficou dentro da casa.

 

“cobre meu ventre antes de ires embora,

para que não me tornes estéril e as criaturas pereçam” , disse a terra para mim.

 

fiz como ela disse e continue andando:

“não queres provar o fruto de meu útero”.

quem falava era o diretor da escola, disfarçado de serpente

e provei o  tal fruto e meus olhos foram abertos

e desci a montanha entrando no mundo dos homens

e me levaram  para a escola e me jogaram na Sala das  Crianças  do Amor-Empalhado

e me disseram que eu tinha que ser como elas

& a professora entrou e disse: Vocês são pequenos répteis...

 

 

OH! CRIANCINHAS MALVADAS!!!

eu vi, então,  que o que ela escondia atrás da roupa

não era tão importante assim... era apenas uma floresta negra,

cheia de crianças empalhadas.

foi quando percebi Alice do meu lado dizendo:

vamos arrebentar outra vez, seu otário!!!!


 

  

O

ANTIQUÁRIO

  

Na caixa...

Antigos cálices, antigos violinos...

  

as ruas tornam-se belas

quando não há ninguém nelas.

 

na calçada o velho antiquário

aguarda,

desfiando suas relíquias.

 

cisnes de cristal,

porcelanas e realejos.

 

as ruas não são dele,

as pessoa não pertencem a ele,

espinhos de roseiras estão em suas mãos.

  

velhos leões de circo,

pequeno órfão

na turva água do rio,

na escuridão há jóias

e fotografias.

 

o outro lado da cidade,

de casas antigas,

esconde a face do velho homem

e de sua loja de relíquias.

  

antigos relógios de bolso,

livros empoeirados,

de páginas amareladas.

UM SONHO

 um quarto...

abençoada morte corporal rondando as paredes.

 

um homem

outro quarto

 

um homem leva livros de um quarto a outro quarto.

 

escuridão e tristeza

 

no quarto onde estão os livros

há uma janela.

o homem fecha a janela e

leva os livros para o outro quarto,

semeando-os em estantes e

volta ao quarto onde estão os outros livros...

a janela está aberta

ele a fecha outra vez

 

escuridão e opressão

 

medo

o homem percebe o mal na janela aberta,

 

num mundo de traças e páginas.

 

ele cai

ele grita:

 

SALVE ME CHRISTE REDEMPTOR

 

o homem não está mais no quarto;

ele está na frente de uma casa,

onde uma luz ofusca seus olhos,

e embora ele possa ver a luz em seu rosto,

ele não pode ver de onde ela vem.



 

A MORTE

(Soneto XXVII)

  

De cinzas se faz a terra,

de angústia se faz a força

que rompe e dilacera o medo.

De restos humanos riu-se a terra.

 

Do cemitério quieto lanças

teus sussurros tão misteriosos,

atraindo os ratos aos teus porões

de podridão e sangue congelado.

 

Heróis e desertores, santos e pecadores

tombam em tuas mãos

e não percebem que de ti só vem escravidão.

 

Alegria e sofrimento guardas

em teu belo seio, velha dama de negro,

e com tua foice descobres do mundo o segredo.

 

  

 

PARTE II

 

  

FADAS

(Quatro pequenos sonetos)

  

Série Fadas (Pinturas, 2002) feita por Marco Alexandre Rosário para o Livro-Música "Guirlanda de Flores Sangrentas", de 1987.

a) O Brilho Cintilante.

 

pequeno brilho cintilante

no vento azul

que vem rodeando

o verde das tuas asas.

 

corrente de água

que transborda sobre os teus pés

quando adormeces na beira do rio

como uma pequena mulher.

 

asas pequenas que o vento toma

em suas mãos de algodão,

em sonhos obscuros.

 

o estranho azul de tua face,

em contínua transformação

sobre o manto verde.


*Poema reconstituído em 2002.


b) O Lago

o lago convertido em espelho,

onde tua cintilante face,

refletida em pequenos delírios,

parece roubar o silêncio do paraíso.

 

adormecida em constante paz

no intenso sorriso do vento,

mas despertada para brincar

no manto verde.

 

iluminada pelo sol

em constantes rodas,

em constantes risos.

 

iluminada pela lua

em constante festa,

em constantes abismos.

 

*Poema reconstituído em 2002.



c) As Lágrimas e as Delicadas Asas

Pequenas lágrimas sobre as asas

Descem até o rio em estranhos

Movimentos,

 

Como ondas que brilham em teus sonhos,

Pequena mulher encantada,

Pequena mulher encantada.

 

Lágrimas                   em                 sonhos                      tranqüilos.

Lágrimas                   em                 sonhos                      tranqüilos.

Lágrimas                   em                 sonhos                      tranqüilos.

 

Lágrimas                   em                 sonhos                      tranqüilos.

Lágrimas                   em                 sonhos                      tranqüilos.

Lágrimas                   em                 sonhos                      tranqüilos.

 


*Poema reconstituído em 2002.



d) Os Vôos

milhares de pequenas mulheres

encantadas,

em vôos pelos céus coloridos,

deliram em estranhos movimentos.

 

o lago agora convertido em lágrimas,

ao amanhecer

somente reflete as tristezas e alegrias

das pequenas dançarinas.

 

adormecidas em vestidos brancos

sobre o sonho encantado

da morte rápida.

 

vida que dura alguns minutos

em encantados sonhos mortais

para rir numa eternidade pálida.


*Poema reconstituído em 2002.



WHALEIA


Um grande e profundo sonho

No mar,

 

E estranhas senhoras,

Sedutoras,

 

Vestidas de lágrimas salgadas,

Bailam

 

Em cantos noturnos,

 

Onde o marinheiro,

Assustado,

 

Pode ver o estranho desfile,

E suspirar

 

Pela encantada morte

 

nos carroceis aquáticos,

 

afogado

pelo grande delírio do

mar...


oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo

oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo

oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo

oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo

oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo

oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo

oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo

oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo

oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo

oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo

oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo

oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo

oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo

oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo

oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo

oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo

oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo

 oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo

oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo

 oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo

oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo oceano vivo

 

...como um beijo mortal.

 

  ...como um beijo mortal.

 

...como um beijo mortal.

 

...como um beijo mortal.

 

como um beijo mortal.

 

*Poema reconstituído em 2002.




CRIANÇA DE CRISTAL

  

Criança de Cristal,

ao mais leve toque

de mão,

vai ao chão e se quebra;

conduz o silêncio da noite

até a porta da alma,

voa entre as nuvens da aurora

em sua águia alada,

onde não há limites para seus sonhos.

 

Criança de Cristal,

ao mais leve murmúrio

do vento,

cai no abismo e tece um lamento,

quebra-se em silêncio,

e vaga sorridente em seu coração de cristal,

em quietude e dilaceramento entre o bem e o mal.

 

Criança de Cristal,

ao mais doce toque de sino,

vai ao chão e se quebra,

saudando o sol.

Vaga em seu jardim,

apanha um jasmim,

e o leva ao reino de cristal.

abdica dos sentimentos,

guarda o futuro do esquecimento.

 

Criança de Cristal,

passeia em seu jardim e

deixa uma lágrima à realeza.

segue o féretro na solidão,

em seu vestido negro,

e ouve o canto junto ao celestial portão.

absorve dos anjos a face

deixando no espelho uma imagem acre,

toma a taça, brinca com a adaga

e tomba no chão.

 

 

PARA UMA MULHER DA VELHA E LONGÍNQUA ILHA VERDE, EM TRANSE POR SUA BELEZA.

(Canção para uma Imagem)

  

Dedicado à uma imagem de Grace Slick, de 1968.

  

Desejei teus negros cabelos

sobre as antigas colinas da ilha verde.

Desejei teus olhos celestiais

no céu azul da velha Ilha.

Desejei acariciar tua face

deitado em um campo verde da velha ilha.

Desejei teu beijo,

sendo eu um homem velho,

feito de um amor leproso,

no bailar de um canto noturno

da velha ilha.

Desejei ser teu senhor em uma distante gleba.

Desejei te dar sementes para colher

as mais belas flores da Velha ilha.

Desejei tocar tuas

mãos

enquanto estávamos embaixo da pesada abóbada

da Velha Ilha.

Este amor lascivo,

que somente conheço

através de uma envelhecida fotografia,

quero te oferecer,

antes que a noite última

silencie a terra da Velha Ilha.

 

E assim canto para tua imagem,

percebendo teus olhos nos dias,

e seguindo teus passos,

não percebes os meus passos entre os teus.

Eu vi teus olhos entre os dias...

Tudo o que quero é sitiar

em meu coração

o teu olhar.

Segui teus passos entre os dias...

Aonde me queres levar?

Além da estrada ou além do mar?

Eu vi teus olhos entre os dias...

Conta-me porquê as flores

do céu

não querem mais florescer em meu coração...

entre o renascimento da criação.

Eu te imaginei entre os dias...

descansavas deitada sobre as lágrimas

de uma paisagem, entre os portais

de um paraíso, mantendo a guarda

de um rebanho de ovelhas...

Na relva da Ilha Verde

choravas como uma camponesa.

Tudo que um dia foi sonho,

agora está morto dentro de um inquieto louco

 mudo.

Tudo o que vejo é a miséria

ferindo as faces de muitas crianças.

Na relva da Velha Ilha Verde...

lá te encontrarei a minha espera

sempre a aguardar os caminhos da infância,

como se fosse as ruínas de uma velha criança.

Conta-me o porquê desses adormecidos desejos,

Conta-me o porquê de eu adormecer em meus desejos,

Conta-me o porquê de eu adormecer essas

lágrimas num tênue silêncio.

  

 

Eu vi teus olhos entre os dias...

 

Eu vi teus olhos entre os dias...

 

Eu vi teus olhos entre os dias...

 


  

LISA

     TOCANDO

                SEU

                     VIOLINO

                               EM

                                     MEU

                                          DESERTO

  

Lisa tocando seu violino em meu deserto

Lisa tocando seu violino em meu deserto

Lisa tocando seu violino em meu deserto

  

Lisa tocando meu violino em seu deserto

Lisa tocando meu violino em seu deserto

Lisa tocando meu violino em seu deserto

  

Lisa tocando nosso violino em meu deserto

  

Lisa tocando teu violino em teu deserto

Lisa tocando teu violino em teu deserto

Lisa tocando teu violino em teu deserto

  

                               Lisa

                               Lisa

                               Lisa

       em                  meu                deserto

       em                   seu                  deserto

       em                  teu                   deserto

  

 

                           nosso...

 

                             um

 

                          violino

 

                              e

 

                        dinheiro...

 

                            sem...

 

Lisa tocando seu violino em meu deserto

  

Lisa tocando seu violino em meu deserto

Lisa tocando seu violino em meu deserto

Lisa tocando seu violino em meu deserto

  

Lisa tocando meu violino em seu deserto

Lisa tocando meu violino em seu deserto

Lisa tocando meu violino em seu deserto

  

Lisa tocando nosso violino em meu deserto

  

Lisa tocando teu violino em teu deserto

Lisa tocando teu violino em teu deserto

Lisa tocando teu violino em teu deserto

  

                               Lisa

                               Lisa

                               Lisa

       em                  meu                deserto

       em                   seu                  deserto

       em                  teu                  deserto

 

                           nosso...

 

 

                             um

 

                          violino

 

                              e

 

                        dinheiro...

 

                            sem...

 

Lisa tocando seu violino em meu deserto

 

 

  

ADÁGIO

Cem pequenos Olhos

não menos brilhantes,

porém,

não menos temerosos.

Guardaram desejos silenciosos?

 

Talvez

 

Ela quer ficar entre nós.

Não a deixe ir

ao reino do esquecimento.

Aqueles que lá chegam

jamais retornam.

 

Uma nova Atmosfera?

 

Gira o vento,

folhas ressecam,

Gira o vento

através dos dias e das noites.

Ela foi levada

por um beijo

de um homem mortal.

 

Uma nova atmosfera?

 

Sem rima!

Meu riso não tem rima!

Acusam-me as sombras,

que não são minhas,

como se eu  fosse delas.

 

Uma nova atmosfera,

  

Andei girando,

semelhante de um  morto,

em torno dos primitivos oceanos,

tateando entre as vagas,

semelhante de um cego.

 

Uma nova atmosfera?

 

Sim, ela é passional.

Oculta-se na floresta

e não quer ouvir o vento.

Consolado pelo medo,

ia cantando pelo vale

e dizendo:

 - não sou desta terra!!!

minha canção não é a canção do tempo!!!

 

E como um anjo

ela subiu aos céus

querendo alcançar a divindade.

Despencou

rumo ao abismo,

uma tempestade

em suas veias,

uma legião de demônios

em sua vida erma.

 

Uma nova atmosfera?

  

Campo deserto e devastado,

onde vi um cemitério de reis antigos...

Chamar por alguém aqui

é chamar pelo silêncio.

ah! Vou descansar um pouco.

Meus ossos dissolveram-se na terra

que não foi minha;

meu sangue derramou-se no rio

que não foi meu.

Estou cansado!

Porquê não cantas para mim?

Tu que rolaste do céu para o abismo...

Descobriste a nova atmosfera?

Já não tenho casa...

Já não tenho ninguém...

Só quero que me deixes dormir.

 

Uma nova atmosfera

 

O entardecer é sempre mágico:

relva cintilante,

nuvens peregrinas,

raios de sol

penetrando os mistérios

e o véu de chuva

que se aproxima.

Belo quadro!

O nobre pássaro e sua corte

trespassam o verão.

Adeus aos orvalhos desconhecidos.

 

Uma nova atmosfera,

 

Encerrem a cena,

adormeçam as flautas de fogo

e os acordes de ouro.

Basta!

Tenho nos lábios o riso de uma fada

e quero estar morto antes do anoitecer.

 

 

MÚSICAS

 

 

MÚSICAS DO LIVRO-MÚSICA “GUIRLANDA DE FLORES SANGRENTAS” (compostas e gravadas em fevereiro de 1987).

  

1. Prelúdio  (Monna em seu Leito de Morte) (Marco Alexandre Rosário).

    Gravado em Belém, Pará.

    Instrumentos: piano.

  

2. Cordões de Prata & Ouro (Marco Alexandre Rosário).

    Gravado em Belém, Pará.

    Instrumentos: cravo.

  

3. O Antiquário (Marco Alexandre Rosário).

    Gravado em Belém, Pará.

    Instrumentos: piano.

  

4. A Morte (Soneto XXVII) (Marco Alexandre Rosário).

    Gravado em Belém, Pará.

    Instrumentos: órgão.

  

Fadas (Quatro Pequenos Sonetos)- (Marco Alexandre Rosário).

5. a) O Brilho Cintilante.

    Gravado em Belém, Pará.

    Instrumentos: xilofone - teclados.

 

6. b) O Lago.

    Gravado em Belém, Pará.

    Instrumentos: xilofone - teclados.

 

7. c) As Lágrimas e as Delicadas Asas.

    Gravado em Belém, Pará.

    Instrumentos: xilofone - teclados.

 

8. d) Os Vôos.

    Gravado em Belém, Pará.

    Instrumentos: xilofone - teclados.

  

9. Whaleia (Marco Alexandre Rosário).

    Gravado em Belém, Pará.

    Instrumentos: piano e bateria eletrônica.

  

10. Criança de Cristal (Marco Alexandre Rosário).

    Gravado em Belém, Pará.

    Instrumentos: violão eletrificado.

  

11. Para uma Mulher da Velha e Longínqua Ilha Verde, em Transe por sua Beleza (Canção para uma Imagem) (Marco Alexandre Rosário).

    Gravado em Belém, Pará.

    Instrumentos: órgão - teclados.


12. Lisa Tocando seu Violino em Meu Deserto (Marco Alexandre Rosário).

    Gravado em Belém, Pará.

    Instrumentos: violão.

 

13. Adágio (Marco Alexandre Rosário).

    Gravado em Belém, Pará.

    Instrumento: harpa nordestina.

 

 

EDITORA MORANGOS & UVAS

(SEACULUM OBSCURUM)

 

EDITORA OGMIOS

(SEACULUM OBSCURUM)

 

          GRAVADORA ARTE DEGENERADA

 

SÉRIE BLITZBUCH

 

(1984 – 1993)

 

(2002-2011)

 

GUIRLANDA DE FLORES SANGRENTAS

 

1ª EDIÇÃO: Fevereiro/1987

1 exemplar.

(Marco Alexandre. Belém, Pará, Brasil)

 

2ª EDIÇÃO: 2005

1 exemplar.

(Marco Alexandre. Belém - Santarém, Pará, Brasil)

 

 

“Tudo o que é esquecido

permanece em sonhos obscuros do passado...

ameaçando sempre retornar.”

(Velvet Goldmine)

 

  

Editora Ogmios (Seaculum Obscurum)

 

Website: www.seaculumobscurum.com

 

e-mail: editoraogmios@yahoo.com.br

 

 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário