INVOCAÇÕES - 1991 - Poesia.
O LIVRO
“INVOCAÇÕES” (DEZEMBRO DE 1991).
Marco Rosário em Mosqueiro em 1990.
Em 1990 eu
conclui o Curso de Direito. Algumas pessoas ficaram espantadas com este fato.
Pensavam que eu jamais conseguiria sair da universidade. Eu escrevi alguns poemas
durante este ano, mas foi um ano em que eu não produzi muitos trabalhos. Foi em
1990 que eu comecei a namorar com Regina Lúcia. Em 1991 escrevi um livro e
dediquei o mesmo para ela. O livro não era sobre ela, mas ela foi a motivação.
Assim, nascia o livro “Invocações”. Na verdade, grande parte deste livro havia
sido escrita entre os anos de 1986 e 1988. Eram pedaços de poemas que eu não
utilizara anteriormente, e resolvi colocar tudo no livro “Invocações”. Este foi
o primeiro livro escrito de forma regular, desde o incidente de 1987.
“Invocações”, apesar da influência da poesia de Jim Morrison (eu havia voltado
a ouvir os Doors novamente) e T. S. Eliot, lembra muito a poesia de Walt
Whitman. Eu só notei este fato muito recentemente, após ler uns trecho de um
livro de Walt Whitman. Evidentemente, “Invocações” se assemelha com a tradução,
e não com o original, já que o livro foi escrito
Entre 1992 e
1993 eu escrevi poucos poemas e juntei todos eles, mais alguns poemas escritos
desde 1981 (que não estão nos livros anteriormente escritos) numa coletânea de
poesia denominada “Amálgama – Uma Coleção de Obscenidades” (2002). “Amálgama”,
como eu disse anteriormente, seria o título do primeiro livro da Editora
Ogmios, que foi mudado para “Poemas” (1984).
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INVOCAÇÕES
*
MARCO ALEXANDRE
DA
COSTA ROSÁRIO
EDITORA OGMIOS
(SEACULUM OBSCURUM)
1991
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INVOCAÇÕES
*
MARCO ALEXANDRE
DA
COSTA ROSÁRIO
%
%POESIA%
%
EDITORA OGMIOS
(SEACULUM OBSCURUM)
*BLITZBUCH*
1991
“A poesia deve ser
feita por todos”
(Isidore Lucien Ducasse-Lautréamont)
“Amigos,
sondem o labirinto”
(James
Douglas Morrison)
“Senhoras!
Levantem as saias.
Vamos atravessar o inferno!”
(William
Carlos Williams)
Para Regina
Lúcia.
o anjo
despertou ao amanhecer
e estendeu as
mãos para o sol,
sua voz
celestial ecoou pelos salões
do tempo
infinito,
numa linguagem
qualquer...
lembrou-se ele
daqueles que o feriram
como num filme
antigo, de imagens gastas,
o coração
negro e cheio de ódio,
a razão
iluminada e cheia de amor.
o livro nos
mostra recordações inúteis,
versos
esquecidos em uma câmara funerária,
dentro do
cérebro torcido de um cão,
corredores
apodrecidos
onde lhe será
erguido um monumento.
você tem medo
de alguma coisa?
não é preciso...
apenas olhe através
desta manhã
e observe as
criptas e as rosas
no cemitério
do amor,
cada rosto que
se foi,
cada imagem
que nos seduziu,
até virarmos
pó...
alguma
palavra?
imagens que
ainda queira reter?
desertos
humanos que ainda queira percorrer?
Ooh!
Infelizmente o filme acabou...
atravessando o crânio
apodrecido
de uma besta humana,
cambaleamos calados & sujos
de bar em bar,
até afundarmos no oceano de asfalto,
sob as luzes dos faróis
dos automóveis,
iluminados por fogos-fátuos;
a realidade que esculpimos seria um sonho que,
quando adormecidos & bêbados,
daria lugar à realidade invisível
de uma cópula selvagem
filhos brotando nas calçadas,
filhas vadias, banidas de casa,
morando em santuários noturnos, sem divindade;
o medo no esgoto cerebral
& forasteiros roncando o motor nas fronteiras.
Ela surgiu de um
beijo na noite
& emergiu para rir até os confins do amanhecer.
disse ela à mãe:
- teu mundo não vive em minha carne.
disse ela à mãe:
- tuas algemas não servem para mim.
disse ela à mãe:
- tua escola incendiei.
& então acusaram meu amigo de adultério
por ter ele queimado um beijo na boca da
mulher-serpente
& ela, filha de uma cadeia de má sorte, sorriu
& todas as mulheres contra uma,
quando se sabe que a mulher do presidente
ama atrás de Kepes & Lekes...
tudo por uma iniciativa sexual privada &
libertária,
& após a festa de casamento
ela agiu para destruir & não para construir
l e e nos atormenta ainda c s e
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orações fora do tempo
& então percorremos as áridas
referências
a procura de um sangue
qualquer,
derramado
em nossos sonhos,
para provar tua exuberância...
olhos paralisados em fontes
estagnadas.
& a
poeira sobre as estações...
ela suspirou nas áridas referências
esperando a oitava hora.
todos os
fins correm para as referências de um único fim
e o teu fim em todos os fins não está...
o teu fim repousa em algum
encontro desordenado.
cada poente
é uma espera para um retorno possível
& estando ali, ou do outro lado
deste lugar,
não há existência que habite
onde as portas
estão fechadas & as casas em declínio
servindo de exílio para o rato e para
a sacerdotisa
num muro de palha erguido
para o vento.
a morte é e
sempre será prisioneira da inconstância da vida.
porém, só a morte da vida construirá
um novo caminho para
além do infinito, para além
dos portões desta cidade.
manhãs em
fragmento, horas em ordem feitas para a desordem...
aurora estilhaçada em pontos de ônibus
por aqueles que limitam o
jardim para nada criar.
& assim
fizeram aqueles que ontem aguardavam a próxima viagem
& agora germinam escassez nos
cemitérios,
copulando com quantos pelas
ruas caminhassem,
até que uma
nova onda de afrodisíacos os levassem às sepulturas
ou a um novo altar de revistas
pornográficas
onde uma janela nos mostra um
campo apodrecido.
procuro a
flor, a voz não mais existe nas horas do relógio
a voz está mutilada pela confusão do
silêncio
& as horas do relógio
estagnadas para sempre
o vento, a
dama e uma antiga dança,
ainda que a música não possa mais ser
ouvida
neste quarto de insanos.
ali, no
campo descolorido, onde me disseram viver a sabedoria,
fiz
um exílio e oculto meus significados.
ali, tudo converge para um fim
único.
fomos para os vales
deixando a cidade para trás.
adormecidos, vimos
o girar das constelações
desejando
o
significado
do
tempo
e o entendimento do silêncio
fomos para
os vales
deixando a cidade para trás
há em mim o homem e o lobo
há em mim o são e o insano
há em mim homem e mulher
há em mim velho e criança
fomos para os vales
deixando a cidade para trás.
adormecidos, vimos
o girar das constelações
desejando
o
significado
do
tempo
e o entendimento do silêncio...
as visões do silêncio.
vai até à beira do
rio
e
ouve o silêncio
ele é teu único
amigo
o silêncio
o silêncio
o silêncio
o silêncio
o silêncio
o silêncio
teu... único... amigo...
o
silêncio... o silêncio... o silêncio... o silêncio...
o silêncio
a cada novo escândalo,
ele regressava à casa
como se viesse de uma grande batalha,
sempre amparado e conduzido por estranhos espectros
do passado,
solitários espíritos, irmãos invisíveis,
e o caos que criava,
todas as noites ficava para trás
em seus pensamentos,
e na manhã seguinte
regressava à vida
em meio a névoa,
e diante de um sol imaculadamente doido
olhava os retalhos de sua vida.
Os homens-cães andavam em suas motos
através da planície.
Mulheres-tristeza os acompanhavam,
mudas e quietas,
a cada parada, para fazerem
um saque, ou estuprar alguma serpente.
Entre eles havia um, o mais sábio e mais belo,
seus cabelos dourados o vento acariciava.
Ele teve uma estranha visão:
a morte que nos desperta para a própria morte,
em um universo repleto de estrelas negras.
O homem-cão olhava para o sol e para a lua e imaginava
como roubar seu bando da morte,
antes que o dilúvio tivesse seu novo ciclo,
e um novo pesadelo espalhasse suas sementes outra vez.
Guitarras são ouvidas e esquecidas
Dançam aleijados, loucos e leprosos,
a espera de novos discos:
a tribo tem aí seu mais belo ritual.
Suaves são os sons
que o músico, ressuscitando embrionárias lembranças,
tece.
Criador de artificiais paraísos.
A morte afoga nossos sonhos
no vasto oceano da inconsciência.
Silencia o amor e cala as paixões,
encobre de esquecimento as carícias, o romance,
esfria-nos com um único e último beijo.
Sem ninguém a seu lado, vaga ela pela rodovia...
lágrimas enegrecidas pela poeira são derramadas
sobre o corpo de seu amante.
Ela quer nos propor alívio de vida,
ou a viagem para outros palácios de sonhadores,
que não podem mais ser lembrados.
Foge desta cidade, humilde habitante.
Leva contigo tua mulher e teus filhos,
pois, o anjo aproxima-se dos jardins e dos portões.
Pela rodovia...estupro, casas incendiadas,
saques,
morte, loucura,
homens enlouquecidos,
viagem profunda, dentro do pesadelo sem fim.
viagem profunda, dentro do pesadelo sem fim.
viagem profunda, dentro do pesadelo sem fim.
viagem profunda, dentro do pesadelo sem fim.
você recordará meu rosto
quando eu não estiver mais aqui?
você poderá me ouvir rindo
entre as estrelas?
de que cor
eram meus cabelos?
meu riso,
que som tinha?
era profundo
o meu olhar?
você lembrará de mim daqui a milhares de anos,
numa distância que minha alma não lhe pode descrever?
Acorda do sonho da morte!!!
nossos corações batem por muito pouco tempo..
assemelhamo-nos aos vermes, somos frágeis...
toquemos os tambores e flautas e violas...
despertaremos os cemitérios no fundo do oceano.
congreguemo-nos na areia estrelar deste universo,
exijamos o amor enquanto estamos vivos.
multidões de olhos
famintos por vida,
grandes espíritos
reacenderão a vida para a vida novamente,
as escolas estão apodrecidas,
nos ensinam mentiras.
semearemos flores, então,
e edificaremos novos jardins
precisamos curar nossas feridas
precisamos
apagar o ódio
precisamos de amor, límpido amor
incendiaremos motéis,
libertaremos frágeis almas ingênuas
abriremos as portas e as janelas do céu vazio
e mostraremos o sol à prostituta
precisamos de liberdade
precisamos
beber o doce vinho
precisamos de nós mesmos apenas
Dançaremos
na noite
no
interior da floresta, não muito longe do mar,
em
volta do fogo...
celebremos
constelações & significados
não
muito longe do mar
não
muito longe do mar
não
muito longe do mar
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“Outrora,
quando o mundo foi povoado pela primeira vez, não se viam rios, pois estavam
fechados em uma caverna...Os acessos dessa caverna estavam bloqueados por um
enorme rochedo. Não só os rios mas também os seus habitantes estavam fechados,
como o salmão. Primeiro foi o corvo que conseguiu vencer essa barreira. Depois
o rio Bella-Coola ficou livre.”
“O
velho Homem-Coiote construiu um barco. Começou a chover de tal maneira que as
montanhas ficaram submersas. O coiote viu dois patos e pediu que mergulhassem,
procurassem terra e a trouxessem. Um deles desapareceu sob as águas, mas o
outro conseguiu trazer no bico um pouco de lama, a qual o coiote espalhou a sua
volta e se tornou a terra. Traçou nela rios, modelou montanhas. Dessa lama fez
nascer bisontes e cães, e todos os animais, inclusive o homem. Da mesma lama
fez para si uma esposa. O coiote instituiu também ritos, entre os quais o de
uma dança por cada inimigo morto.”
as chaves do jardim foram perdidas...
do
cemitério, canções são ouvidas, suplicantes...
este mundo de dinheiro apodreceu,
ainda que tenha o poder de comprar e vender
ilusões,
alívio em lojas, mulheres e risos...
este reino está no fim.
ignorantes aberrações em motéis
são flageladas, mas nunca o delírio do amor
vive em tais santuários
há fome nas ruas, há sangue nos presídios
homens-porcos acendem seus cigarros
& almoçam suas mulheres-abutres numa
orgia de interesses
esqueceram a gente humilde,
habitantes sonâmbulos nas
margens da rodovia...
esqueceram o amor
que os regenerava...
esqueceram a aventura
de viver...
ridicularizaram e destruíram
os antigos sonhos...
não tenho lembranças de minha mãe
um quarto com livros e música
e uma mulher que pode ser amada
parece-me um mundo bem melhor
minha verdadeira família vive
do
outro lado deste rio
exuberância e forma,
vertente de
palavras encantadas,
libertário de ódio e indiferença
no
empoeirado ridículo dos dias.
dédalo pálido e ocasional,
respirando
calmamente na cloaca.
testemunha de suas próprias
encenações,
no pavilhão
luminoso dos espíritos.
o belo
ébrio.
amigo íntimo dos espantalhos
crucificados, doentios,
vestidos de
ambições acadêmicas,
embrutecidos e famintos por
sentidos e percepções.
criança de mil imagens, num olhar
de mil anos,
cansada e
devastada,
cabelos longos e dourados,
ordenando a
confusão...
a anciã
imóvel,
repleta de
vida.
numa manhã
se viu paralítico...
o antigo caminhar esquecido, ao
qual nenhum valor deram,
ainda que
procurado,
jamais
alcançado.
anônimo,
foi exposto à multidão,
assassinando o que vira antes
em
sua mente envelhecida...
não lembrou que o tempo retira as máscaras dos enganos.
artífice do rei nos palácios
musicais,
letrado e anacrônico, fez a mentira
transformar-se
em verdade,
veio do pó, e num impulso de grandeza
virou resto
humano
um observador,
contemplando
a memória apagada transfigurar-se
em novidade
e a enrugada profecia cumprir-se em
risos e lágrimas
sobre a
massa bestial de osso e carne,
de passagem pelas ruas,
estacionadas em praças,
ainda
ignorantes e ainda imobilizadas,
esmolando a existência em motéis e
em igrejas.
tal qual a
serpente,
sem respostas, mas com
determinação,
rodeou a
alma de algumas mulheres,
dizendo-lhes como o amor
encontra-se além de todo
entendimento e circunstância.
O
Criador nos deu o chão para caminhar,
e por várias vias
percorrer toda a extensão e
entender o que está
para além de nossas orações;
infinitas salas de sonhos e
pesadelos
profundos oceanos e céus
irrespiráveis,
rituais e celebrações ao luar
em florestas obscuras,
cópulas cristalizantes convertidas em
lodo,
sóbrios
petrificados,
delírios e murmúrios nas ruínas,
o rio perpétuo
explodindo
sem nunca destruir.
o óbvio, o aniquilamento, a repetição
contínua,
indefesa, submissa.
o despertar hibernando os desejos...
os espelhos, os corredores de
imagens sucessivas,
a ânsia nunca interrompida ao redor do
nada,
vomitando dor e fuga,
e inconstância de fala.
o poeta, o filósofo, o artista
e por fim advogado
sem mais nem menos
caiu e morreu!
os que choravam cercaram a
sepultura,
e deixaram
suas inscrições na lápide,
ainda que cuspindo no pobre
espantalho.
e do cemitério todos se foram,
e o santuário do silêncio fez-se
presente
há serenidade no silêncio, tudo
pode ser pressentido de muito longe
e a
sepultura virou útero,
homem
sábio,
nascendo
novamente,
as cinzas
deixadas ao vento,
a antiga
pele queimando ao sol.
ele tudo
arruma,
suas
lembranças, sua vivência,
sem vestígios e sem recordações,
e vestido com roupas de linho,
os cabelos cortados
outra personalidade atravessa sua
contínua essência.
limpou as botas no cemitério,
e partiu,
caminhando para a cidade.
EDITORA
OGMIOS
(SEACULUM
OBSCURUM)
EDITORA
MORANGOS & UVAS
(SEACULUM
OBSCURUM)
GRAVADORA
ARTE DEGENERADA
SÉRIE
BLITZBUCH
(1984
– 2011)
INVOCAÇÕES*
1ª
Edição: 1991.
1
cópia:
(Marco
Alexandre, Belém, Pará, Brasil)
(Regina
Lúcia, Belém, Pará, Brasil).
* Vários partes foram escritas entre os anos de 1986 e
1988.
2ª Edição: 2002.
6 copias :
(Meredith Monk, New York, New
York, USA)
(Patti Smith, New York, New
York, USA)
(Jorge
Alex Athias, Belém, Pará, Brasil))
(Marco
Alexandre, Belém, Pará, Brasil)
(Adriana
Lourdes M. Simões, Belém, Pará, Brasil)
(Tom
Rapp, Port Charlotte, Florida, USA)
“Tudo o que é esquecido
permanece em sonhos obscuros do
passado...
ameaçando sempre retornar.”
(Velvet Goldmine)
Editora Ogmios (Seaculum Obscurum)
Website: www.seaculumobscurum.com
editoraogmios@yahoo.com.br
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