UNS
DIAS
NA
INFÂNCIA
*MARCO ALEXANDRE*
*DA*
*COSTA ROSÁRIO*
CONTO, POESIA & DESENHOS
EDITORA MORANGOS E UVAS
(SEACULUM
OBSCURUM)
BLITZBUCH
1985
*SUMÁRIO
1 – UM
DIA EM 1974.
2 – A
LOJA DE BRINQUEDOS.
3 – O
TRISTE CORAÇÃO DE MICHELLE.
4 –
PÉROLA.
5 –
OUTRA VEZ NOS CAMPOS DE MORANGO.
6 –
OUTRA VEZ UM NATAL.
UM DIA EM 1974.
Lá estava ele, olhando os carros, encostado no poste. Seu nome?
Cor-de-Lágrimas. Encostado no poste ele lembrava longos dias de um passado
distante. Mas, como foi mesmo? Sim, aqueles dias maravilhosos! E entre eles um
especial...Um Dia em 1974!
Cor-de-Lágrimas
era uma criança. Brincava todos os dias com seus companheiros na rua. Naquele
dia ele estava olhando a televisão. Sim, foi aí que tudo começou. Um homem com
óculos de cebola saltou de dentro da televisão.
- Hello, meu jovem! Como vai a vida? Disse o
homem com um sorriso nos lábios.
- Quem é você?!!! Perguntou Cor-de-Lágrimas.
-
Meu nome é Óculos-de-Cebola e tenho um KALEIDOSCÓPIO SURREALISTICAMENTE AMARELO. Não quer dar uma volta nele?
- Você tem um
Kaleidoscópio Amarelo?
- Mas é claro meu amigo. Escute o som dos
motores...
- Mas eu não escuto nada.
- Ora, meu rapaz, este som não é qualquer um
que escuta. Ouça outra vez...
Cor-de-Lágrimas
ouviu uma música se aproximando e, finalmente, lá estava ele, o Kaleidoscópio Amarelo.
-
Como é grande, Óculos-de-Cebola!!! Posso dar uma volta nele?
- Claro meu amiguinho. Entre, por favor.
- Cor-de-Lágrimas entrou pela escotilha do
Kaleidoscópio. Dentro do Kaleidoscópio não havia controles, havia apenas
instrumentos musicais.
- Como o Senhor faz isso andar?!!! Perguntou
Cor-de-Lágrimas.
- É só tocar um instrumento musical. Pegue o
violão e toque um lá.
- Cor-de-Lágrimas pegou o violão e tocou um ré. O Kaleidoscópio Verde deu um pulo bem alto e
voltou ao chão.
- Estúpido!!! Eu disse para tocar um lá e não um ré. Gritou Óculos-de-Cebola.
Cor-de-Lágrimas começou
a soluçar.
- Ora
meu amigo. Eu não quis brigar com você. Eu só disse para você tocar um lá. Você não sabe o que é um lá? Escute...lááá....Ouviu?!!!! Toque
agora.
Cor-de-Lágrimas
deu um sorriso e tocou um dó. O
Kaleidoscópio
Azul saltou três
vezes.
- Me dá isso aqui!!! Com crianças
inexperientes não se pode mesmo confiar. Disse Óculos-de-Cebola.
Então,
pegando o violão, Óculos-de-Cebola tocou um lá. O Kaleidoscópio Verde
submergiu no mar da imaginação.
- Que acha?!!! Não é mesmo maravilhoso? Falou
Óculos-de-Cebola.
- Cor-de-Lágrimas olhava as cores do mar da
imaginação, elas dançavam na sua frente. Nunca tinha visto algo assim.
- Senhor Óculos-de-Cebola, para onde estamos
indo?
- Você já ouviu falar no mar de quadrados?
- Não, nunca.
- Você já viu um tabuleiro de xadrez?
-
Já.
-
Pois é para lá que estamos indo.
O
Kaleidoscópio Vermelho ia cintilando pelas águas do mar da imaginação. Em pouco tempo ele
entrou nas águas do mar de quadrados.
O
Kaleidoscópio Rosa emergiu de um quadrado branco. Óculos-de-Cebola abriu a escotilha
e saiu levando uma cadeira com a mão direita e uma harpa com a mão esquerda.
Ele sentou-se sobre um quadrado negro e ficou tocando sua harpa. As notas que
saiam da harpa iam colorindo o mar de quadrados.
- Divirta-se, meu garoto, antes que o jogo
comece. Disse ele para Cor-de-Lágrimas.
Cor-de-Lágrimas
saltava, feliz, de um quadrado para outro. Entre quadrados Pretos e Brancos ele
saltava e olhava as cores que jorravam de cada um deles e em cada um havia uma
música feita com pequenos instrumentos tocados pelos Chanterfields[1]. Ele, então, aproximou-se
das duas rainhas e, pegando suas mãos, começou a dançar pelo mar de quadrados.
Um
Chanterfield começou a cantar uma antiga canção do reino:
EL REY
Eu vi
El Rey
Andar
de Quatro
De
Quatro Caras Diferentes
De Quatrocentas
Celas
Cheias de Gentes
Eu Vi El Rey
Andar de Quatro
De Quatro Patas
Reluzentes
De Quatrocentas
Mortes...
Eu Vi El Rey
Andar de Quatro
De Quatro Poses
Atraentes
De Quatrocentas
Velas
Feitas Duendes.[2]
Olhavam
os dois reis com ciúme, mas não podiam fazer nada pois só andavam um quadrado
de cada vez.
As
rainhas deixaram Cor-de-Lágrimas perto de Óculos-de-Cebola que dedilhava sua
harpa. Um peão veio correndo e parou diante dos dois.
- Vossa Majestade, o Rei Branco, pede que
vocês se retirem, pois o jogo já vai começar. Disse o Peão do Rei Branco.
Cor-de-Lágrimas
olhou tristemente para Óculos-de-Cebola, mas nada podia ser feito.
Os
dois entraram no Kaleidoscópio Marron e
partiram novamente pelo mar da imaginação. Novas cores, novas notas musicais
Cor-de-Lágrimas encontrou, enquanto Óculos-de-Cebola tocava uma flauta.
- Senhor Óculos-de-Cebola, se eu pedir uma
coisa o Senhor faria.
- Mais é claro, meu garoto. O que é?
- É que eu estava brincando no tanque de lavar
roupas com meu avião, lá no quintal de casa, e o piloto caiu dentro do cano.
- Ah! É muito fácil, meu amigo. Pegarei a
gaita e em pouco tempo estaremos dentro do cano.
Assim
foi feito e num piscar de olhos estavam dentro do cano do tanque de lavar
roupas. Muitas cores eles encontraram pela frente, mas logo tudo ficou azul. Em
pouco tempo encontraram o piloto desaparecido. Cor-de-Lágrimas saiu pela
escotilha com Óculos-de-Cebola atrás.
- Bem, meu amigo. Vou ter que ir agora, disse
Óculos-de-Cebola e tocou uma nota na sua harpa que sempre trazia na mão.
Os
dois, agora, estavam diante da televisão outra vez. Óculos-de-Cebola
despediu-se e entrou dentrofora do Kaleidoscópio Amarelo, e sumiu por dentro da
televisão.
Cor-de-Lágrimas
ficou olhando seu amigo partindo. Depois, ficou feliz pelas aventuras do dia.
Quando
a noite chegou, ele, depois do jantar, foi para a cama dormir um profundo sono
profundo. Lá fora, na rua, uma fina chuva caia.
Então
ele começou a sonhar. E foi caindo e subindo por dentro do sonho.
A LOJA
DE BRINQUEDOS.
- Ei, Garoto! Alguém chamou Cor-de-Lágrimas.
Era um gato de pelúcia que estava atrás de uma enorme cortina.
- Como vai, meu rapaz?!!! Recomeçou o gato.
- Tudo bem, Sr. Gato! Disse Cor-de-Lágrimas.
- Ei, companheiros, temos visitas!!! Gritou o
gato para seus companheiros.
- Que garoto bonito!!! Exclamou a Princesa do
Castelo de Uvas.
- Vamos dar uma festa para ele!!! Gritou o
Soldadinho-de-Chumbo.
Logo
uma banda foi feita: o Saxofone, a Bateria, o Banjo, a Gaita e o Contrabaixo.
Todos começaram a dançar pelo salão. Uma outra música feita com pequenos
instrumentos nasceu de uma caixa de música. A bailarina pegou nas mãos de
Cor-de-Lágrimas e os dois começaram a dançar encima de um Castelo de Espelhos.
Cor-de-Lágrimas
perguntou à bailarina:
- Que lugar estranho é esse?
- Aqui é o Castelo dos Espelhos. Tudo aqui é
imaginação. Respondeu a bailarina.
Tendo
dito isto, começou a bailar pelo grande Salão de Espelhos. Agora o Salão de
Espelhos transformara-se em um grande salão de Gelo.
A
bailarina dançava pelo salão como se fosse uma borboleta voando pelo céu.
Repentinamente, apareceram no salão um grande número de libélulas coloridas. O
Salão de Espelho-Gelo refletia o colorido das libélulas. As cores encheram o
salão e tudo dentro começou a flutuar.
A
bailarina e Cor-de-Lágrimas dançavam, agora, por dentro das cores.
- Não é melhor nós voltarmos para a festa?
Perguntou Cor-de-Lágrimas.
- Está bem, garoto! Disse a bailarina.
Então,
ela fez sinal para uma das libélulas, e os dois voaram por dentro das cores até
sair do Castelo dos Espelhos.
No
salão da Loja a festa continuava animada.
Um grande bolo surgiu e a festa
durou até a madrugada.
- Amigos, vamos cantar a canção “Todos Juntos
Agora”, antes que o dia amanheça. Disse um carrinho de corrida.
O Ursinho de veludo
pegou uma gaita, o peixinho de vidro pegou sua corneta, o Soldadinho-de-Chumbo
sentou-se na bateria, a bailarina pegou o violão e todos juntos começaram a
tocar:
All
together now
One two
three four, can I have a little more?
Five six
seven eight nine tem, I love you,
A b c d,
can I bring my friend to tea?
E f g h i j, I love you.
Bom bom bom bompa bom, sail the ship, bompa
bom,
Chop the
tree, bompa bom, skip the rope, bompa bom. Look at me.
All
together now, all together now,
All
together now, all together now.
All
together now, all together now,
All
together now, all together now.
Black
white green red, can I take my friend to bed?
Pink
brown yellow orange and blue, I love you.
All
together now, all together now,
All
together now, all together now.
All
together now, all together now,
All
together now, all together now.[3]
- Todos juntos agora! Agora! Agora! Gritou Cor-de-Lágrimas.
- Acorda, meu filho! Outra vez sonhando, heim!
Quem falava era a mãe de Cor-de-Lágrimas.
O
garoto despertou um pouco assustado, porém, estava alegre. Sua mãe nunca entenderia
o Castelo dos Espelhos. Afinal, ela não era mais criança, e os adultos, agora
Cor-de-Lágrimas sabia, só conseguem ter pesadelos.
Havia
uma menina que morava do lado de sua casa. Seu nome era Michelle e era um pouco
mais velha do que ele. Todos os dias eles brincavam juntos: subiam nas árvores,
colhiam flores nos jardins, mas a brincadeira preferida era o esconde-esconde.
Um dia ela escondeu-se e quando Cor-de-Lágrimas foi procura-la não mais a
encontrou.
No
dia seguinte, às 6 horas da manhã, Michelle levantou-se e abriu a porta do seu
velho quarto. Olhou a rua com olhos de sonhadora tentando desvendar os
mistérios do dia. E lá se foi ela, pisando na solidão da rua, enquanto o sol
levantava-se no horizonte.
Cor-de-Lágrimas
acordou cedo também e foi para a janela esperar por sua amiga, desejando as
respostas para o seu enigmático desaparecimento no dia anterior.
- Aonde você vai? Perguntou Cor-de-Lágrimas.
- Vou procurar vaga em algum colégio.
Respondeu a menina.
- Para quê? Perguntou ele outra vez.
- Para estudar e me livrar do sacrifício de
nossas vidas. Disse ela com um sorriso nos lábios.
- E depois? Você não vem brincar comigo?
- Depois irei para meu velho quarto onde há
segredos que ninguém sabe. Hoje não posso brincar contigo.
Cor-de-Lágrimas
olhava a amiga caminhando pela rua. Com tristeza no coração, ele voltou para
dentro do quarto. Não entendia por que não haveria de brincar com a companheira
naquele dia.
Alguns
dias se passaram. Novamente a garota saiu de seu quarto e olhou a rua deserta.
Cor-de-Lágrimas outra vez foi para a janela, esperar, ansiosamente, as
respostas da manhã.
- Aonde você vai? Começou ele.
- Vou procurar vaga em alguma fábrica. Disse
ela.
- Para quê? Perguntou Cor-de-Lágrimas.
- Para amenizar o sofrimento de nossas vidas.
- E o colégio? Perguntou ele outra vez.
- Não havia vagas. Respondeu ela.
- E depois? Você não vem brincar comigo?
- Depois irei para a solidão de meu quarto,
onde tenho guardado uma caixinha com todas as lágrimas da minha vida. Eu não
brincarei contigo outra vez.
Ela
tinha uma caixinha onde guardava todas as lágrimas de sua vida.
Cor-de-Lágrimas
começou a chorar porque a amiga não mais voltaria a brincar com ele.
Silencioso, ele entrou em seu quarto.
Muitos
dias haviam se passado. Michelle não era mais uma menina, ela agora era uma
mulher.
Num
dia, Cor-de-Lágrimas levantou-se cedo e foi para a rua brincar. Do começo ao
fim da rua não se via ninguém. Passou-se alguns segundos e Cor-de-Lágrimas
avistou alguém vindo em sua direção. Era Michelle que estava chegando da rua
naquele dia. Cor-de-Lágrimas esperava apreensivo as respostas do dia.
- Da onde você vem?
- Estou chegando da rua, onde as mulheres da
noite são tristes e onde as lágrimas estão sempre ocultas pela dor. Disse ela
com lágrimas nos olhos.
- E o colégio, a fábrica? Perguntou Cor-de-Lágrimas.
- Não havia vaga em nenhum lugar. Respondeu
Michelle.
- E agora.. O Que você vai fazer? Perguntou
Cor-de-Lágrimas.
- Agora irei levar meus segredos e lágrimas
para os homens em troca de alguns trocados.
Ela
levou seus segredos e suas lágrimas e os homens as despedaçaram.
Cor-de-Lágrimas entrou em sua casa e ficou muitos dias meditando nas palavras
da amiga. Nunca mais ele a viu. Ela desapareceu de sua casa e por longo tempo
Cor-de-Lágrimas não ouviu falarem dela.
PÉROLA
Esta
canção falava de uma moça que tinha olhos verdes, cabelos castanhos que iam até
a cintura, vestidos do mais profundo azul, e que morrera num lago. Porém, quem
passava pelo lago ouvia sempre um canto de amor. Neste momento, dizia a canção,
brotavam na margem as mais belas flores e os pássaros vinham cantar e voar em
redor do lago. Todas as vezes que Cor-de-Lágrimas ouvia esta canção lembrava-se
de Pérola. Mas, quem era esta tal Pérola.
Pérola
era uma cantora que vivia nos bares da cidade. Cor-de-Lágrimas sempre a via
passar pela rua. Seus olhos eram verdes como as águas do mar, seus cabelos eram
castanhos, bem grandes e sempre se via nelas várias flores. Ela sempre vestia
uma blusa azul e tinha um sorriso belo, onde se podia notar, levemente, um
coração infantil. Sempre que passava pela rua e via Cor-de-Lágrimas brincando,
ela parava e lhe dava uma flor ou pedaço de chocolate, e quando não tinha nada,
dava um sorriso e brincava com ele de esconde-esconde.
Certa
noite, Cor-de-Lágrimas viu Pérola cantar em um bar que ficava perto de sua
casa. Sua voz não era das melhores, mas todos, no bar, aplaudiram quando ela
acabou de cantar. Cor-de-Lágrimas ouvia, do lado de fora, a amiga, e via em
seus olhos um certo toque de dor misturado com um sorriso infantil.
Na manhã seguinte, ele a
encontrou na rua. Ela parecia abatida e tinha lágrimas nos olhos. Quando
Cor-de-Lágrimas perguntou a ela por quê estava chorando, ela respondeu apenas
que suas lágrimas desciam de seus olhos quando ficava triste. Então apanhou uma
bela flor que estava em seu cabelo, deu ao menino, e disse:
- Tome uma flor para você nunca mais esquecer
do amor. Você lembrará sempre de mim, não é?
Cor-de-Lágrimas
fez não com a cabeça. Ela sorriu para ele e foi embora.
Um
dia, Cor-de-Lágrimas ouviu falar que uma moça havia se afogado no lago da
cidade e começou a notar que sua amiga nunca mais passara pela rua. Então, lhe
disseram que a tal moça era Pérola.
Muitos
dias depois, quando tinha tempo, Cor-de-Lágrimas ia até o lago. Sentado na
margem, ele ficava contemplando a beleza do lago, e quando às vezes adormecia,
uma música suave nascia de dentro do lago, fazendo com que ele despertasse, e
em volta do lago brotavam flores e os pássaros vinham e pousavam na margem.
OUTRA
VEZ NOS CAMPOS DE MORANGO.
- Como você se chama?
- Cor-de-Lágrimas. Disse Cor-de-Lágrimas.
- Eu me chamo Alice. Este é o Coelho Falante.
Disse a menina.
- Como vai companheiro. Falou o coelho.
- Vamos brincar! Disse Alice para
Cor-de-Lágrimas. Nós nos escondemos e você tente nos achar. Certo?! ! ! !
- Certo! Disse Cor-de-Lágrimas fechando os
olhos e começou a contar até 10, enquanto Alice e o coelho se escondiam. Quando
ele acabou de contar saiu a procura de Alice e de seu companheiro. Procurou
entre as árvores, procurou no lago, mas não os encontrou. Quando passava perto
de algumas flores, ouviu um riso. Foi andando devagarinho e quando chegou perto
de uma pedra exclamou:
- Encontrei vocês!!!!
- Sua boba! Eu disse para você não rir alto.
Disse o coelho zangado.
- E agora, do que vamos brincar? Perguntou Cor-de-Lágrimas.
Alice
tirou um grande lençol azul do bolso de seu vestido e disse para o menino:
- Entre! Vamos, entre! Gritou Alice com um
sorriso.
- Entrar
para onde? Perguntou Cor-de-Lágrimas assustado.
- Entrar para onde? Entrar no lençol! Disse
Alice.
Cor-de-Lágrimas entrou
no lençol e começou a cair por dentro de um túnel. Muitas cores ele viu
enquanto caia. Logo chegou em um campo enorme, e viu uma casinha. Alice e o
coelho chegaram logo em seguida.
- Vamos até a casa da infância. Disse Alice.
- O que tem lá? Perguntou Cor-de-Lágrimas.
- Ora, vamos até lá e você saberá. Disse o
coelho.
Os
três deram três passos e logo estavam na frente da casinha. Abriram a portinha
e entraram. A casa estava em festa: palhaços pulavam de um lado para o outro,
os quatro músicos tocavam encima de um grande bolo (o burro tocava flauta, o
cachorro tocava tambor e o gato e o galo improvisavam no vocal), Branca de neve
e os sete anões estavam lá também, como também o saci, a onça pintada e o boto.
Também estavam presentes a banda psicodélica, a bela adormecida e o pessoal da
Vila Césamo.
Cor-de-Lágrimas
começou a se divertir, pulando e correndo pelo jardim. Sim, pois havia um
grande jardim dentro da casinha e era bem grande. Pássaros cantavam, crianças
sorriam, Alice e a lebre telhuda jogavam xadrez e todos se divertiam. Então, a
banda psicodélica começou a tocar uma música sonhadora:
CAMPOS DE MORANGO PARA SEMPRE
Deixe-me levar você para baixo
Porque estou indo aos campos de morango
Nada é real
E não há nada para se preocupar...
Campos de Morango para Sempre
Viver é fácil com os olhos fechados
Confundindo tudo o que você vê
É difícil ser alguém
Mas tudo funciona fora
Isto não significa muito para mim
Deixe-me levar você para baixo
Porque estou indo aos campos de morango
Nada é real
E não há nada para se preocupar
Campos de Morango para Sempre...
Eu acho que ninguém está em minha árvore
Eu quero dizer que poderia estar no alto ou
em baixo
Isto é o que você não pode saber da canção
Mas está tudo certo
Eu acho que isto não é tão mal.
Deixe-me levar você para baixo
Porque estou indo aos campos de morango
Nada é real
E não há nada para se preocupar
Campos de Morango para Sempre...
Sempre, e não algumas vezes,
Eu acho que sou eu
Mas você sabe que eu sei
Quando isto é um sonho
Eu acho que sei o significado de um “sim”
Mas tudo está errado
Isto é, eu acho que não concordo
Deixe-me levar
você para baixo
Porque estou indo aos campos de morango
Nada é real
E não há nada para se preocupar
Campos de Morango para Sempre...
Campos de Morango para Sempre...
Campos de Morango para Sempre...[4]
Quando a canção acabou,
todos saíram da casa da infância. Mas ninguém mais era criança e cada qual
seguiu seu caminho. Cada um caminhou sozinho pela longa estrada da vida.
OUTRA
VEZ UM NATAL.
Cor-de-Lágrimas decidiu
andar pela rua, cansado das muitas recordações da infância. Caminhava
silencioso, maldizendo o mundo dos homens que o tinham lançado naquele abismo.
Ele agora era um homem, com seus vícios, suas mulheres e seu carro. O mundo da
infância jazia na sua frente. Brincadeiras, jogos e sonhos estavam mortos.
Começou a chover e ele tentou correr, mas não conseguiu. Nisso, alguém
levemente tocou em seus ombros.
- Michelle! Exclamou Cor-de-Lágrimas.
- Ainda se lembra de mim? Faz tanto tempo.
Disse a moça.
- Para onde você está indo? Perguntou
Cor-de-Lágrimas.
- Estou andando sem rumo. E você? Disse
Michelle.
- Há Michelle! Estou andando pela rua,
pensando nos dias de minha infância. Lembra? Como nós éramos felizes naqueles
dias!
- O passado não pode voltar mais. Mas por quê
você não transforma-se em criança outra vez. Disse a moça.
- Mas como? Como posso voltar a um tempo que
não existe mais? Disse Cor-de-Lágrimas.
- É preciso renascer, é preciso renovar. Veja,
a vida não se estagna. Ela está sempre
Os
dois foram andando até uma praça e sentaram-se num banco. Cor-de-Lágrimas
escutava com atenção as palavras da moça.
- Escute! Disse ela.
- O quê? Disse Cor-de-Lágrimas.
- Escute o silêncio. Ninguém pode renascer se
não conhece o silêncio. Eu não dou mais meus segredos e minhas lágrimas para os
homens. Eu aprendi a escutar o silêncio.
Michelle
se aproximou de Cor-de-Lágrimas e olhou profundamente em seus olhos. Então, ela
o beijou. Mas não um beijo de mulher, de prazer. Era um beijo de mãe, de irmã,
de amor, um beijo do espírito.
- A vida é um longo caminho, irmão. Disse
Michelle.
Quando
Cor-de-Lágrimas chegou em casa naquela noite, ajoelhou-se e rezou a oração
eterna. Rezou não como homem, mas como criança, e seu coração se abriu para
receber o paraíso que não tem fim, fora do tempo.
Na
manhã seguinte, ele levantou cedo. Apanhou seu violão, um livro de poemas de um
poeta antigo, o Livro da Vida e da Verdade e saiu para nunca mais voltar ao
mundo dos homens, cantando uma canção que tinha feito quando o sol nasceu:
UMA
PÁGINA DE MINHA VIDA.
O vento sopra uma triste canção
E eu estou tão sozinho.
Meus olhos estão cansados
De tanto ver.
Andei bêbado pelas ruas,
Caí nas mãos de mulheres
Que nunca amei.
Mas agora me levanto
E começo a caminhar.
Sobre um amor frágil
Tenho arrastado minha
Existência,
Confundindo os caminhos.
Sim, estou velho e em
Meus olhos a dor se confunde
Com o amor.
Mas talvez não
Tenha sido em vão,
Pois agora quero ser jovem
E caminhar outra vez.
Sim, conheço as lágrimas
Das mulheres da rua,
Conheço a dor de uma
Existência ferida.
E o vagabundo que passa
Pela rua, anônimo em suas
Lágrimas, também conheço.
Conheço o poeta que ébrio
Passeia pelos campos
E ele quer encontrar
Um caminho.
Conheço as garotas em seus
Carros favoritos
E em seus olhos
Há muitas lágrimas.
Agora todos sabem
Que o tempo aniquila
As ilusões.
E eu ouvi bem o professor Tonto falar.
Ouvi suas hipócritas
Palavras de liberdade que
Levam a escravidão.
Eu o vi arrastando as crianças,
Oprimindo-as, com suas
Mentiras.
Mas ele não acreditou quando
Lhe disseram que elas
Um dia iam se revoltar.
E agora todas as crianças
Estão assustadas e ninguém
Mais quer ir à escola.
E no mundo da infância
Tenho encontrado e juntado
Todas as minhas lágrimas.
E às tenho bem seguras
Em minha mão.
E elas refletem a miséria
De cada irmão e irmã que
conheci dentro de mim.
E eles têm me falado
De uma visão de amor.
E agora ando ébrio, com
Eles em meu coração, mas
Tenho controle sobre meus
Pés.
Sim, eu conheço um caminho,
Um caminho verdadeiro
Um caminho de luz
Que só os santos
e poetas conhecem e por
isso são perseguidos.
E apesar de eu ser
Um grande mentiroso
A verdade que está dentro
Dele é maior, pois, a verdade
É mais forte que
A mentira.
E este caminho traz
ntro de si uma luz pura
E de renascimento.
E agora caminho sozinho
Mas tenho a certeza de
Estar com os olhos bem
Abertos.
EDITORA OGMIOS (SEACULUM OBSCURUM)/
GRAVADORA ARTE DEGENERADA
1984-1993
2002-2011
A
Editora Ogmios (Seaculum Obscurum) – Gravadora Arte Degenerada foi um projeto
de arte experimental, criado por Marco Alexandre da Costa Rosário, envolvendo
poesia, música e pintura, o qual teve sua existência entre os anos de 1984 e
1993, e foi novamente iniciado a partir de 2002. Seu primeiro nome foi Editora
Morangos & Uvas (Seaculum Obscurum), denominação esta que foi usada até
1986. Este nome foi inspirado pelo quadro tríptico O Jardim das Delícias, de
Hieronymus Bosch, e pelo filme Morangos
Silvestres (SMULTRONSTÄLLET), do
diretor sueco Ingmar Bergman. Ogmios é uma antiga divindade celta, conhecida
também como o Velho Calvo. Segunda a lenda, de sua língua saiam fios de ouro
que enlaçavam as orelhas das pessoas e elas eram forçadas a ouvi-lo. A palavra
latina Saeculum foi alterada: a letra
e
troca de lugar com a letra a, formando a palavra Sea
(mar em inglês) culum, ou seja Seaculum Obscurum, ou o mar da obscuridade
secular, que é o modo como Marco Alexandre vê sua época. Todos os livros da
Editora Ogmios (Seaculum Obscurum) pertencem a série BLITZBUCH
(livro-relâmpago). Esta junção de duas palavras alemãs é uma sátira à
Blitzkrieg dos nazistas. Juntamente com a Editora Ogmios (Seaculum Obscurum),
em 1986 Marco Alexandre criou a Gravadora Arte Degenerada, uma experiência
alternativa na área da música. A Editora Ogmios (Seaculum Obscurum) teve
bastante influência da música, literatura, pintura e cinema de vários países.
Seus dois princípios máximos eram: a arte não se vende e a arte não
tem fronteiras.
De
todas as obras realizadas pela Editora Ogmios (Seaculum Obscurum), as duas mais
importantes foram os livros Iluminuras e Guirlanda de Flores Sangrentas. Estas
duas obras foram completadas em 2002, pois ficaram inacabadas nos anos em que
surgiram (1986 e 1987). Na verdade, alguns poucos poemas e todas as pinturas
foram elaborados no ano de 2002, com o objetivo de completar estas duas obras.
Depois dos últimos poemas escritos por Marco Alexandre (em 1993), a Editora
Ogmios (Seaculum Obscurum) silenciou por muitos anos, embora alguns pedaços de
poemas isolados tenham sido feitos no transcorrer dos anos. Em 1994, Marco
Alexandre fez uma espécie de coletânea com as músicas que ele gravou em fitas
cassete (até hoje conservadas) entre os anos de 1981 e 1988. Em 2001, Marco
Alexandre conheceu, através da Internet, o músico americano Tom Rapp, líder do
lendário grupo Pearls Before Swine
(1967-1971) e uma das maiores influências da Editora Ogmios (Seaculum
Obscurum): Marco Alexandre conheceu o trabalho deste grupo em 1983, através do
Lp One Nation Underground, lançado
pela ESP-DISK em 1967. Tom enviou para Marco Alexandre uma cópia de seu último
Cd:
A Journal of the Plague Year
(1999). Este encontro estimulou Marco Alexandre a recomeçar seus trabalhos na
Editora Ogmios (Seaculum Obscurum) no ano de 2002: os textos dos livros
originais foram digitados em computador; as músicas foram transferidas para CDs
(a partir de março de 2005), poemas foram reconstruídos, livros inacabados
foram completados, etc. O primeiro livro da nova fase foi a segunda edição do
livro As Flores (de 1985), feita em fevereiro de
Marco
Alexandre da Costa Rosário nasceu na cidade de Belém, Estado do Pará, Brasil,
em 7 de fevereiro de 1966. Atualmente, Marco Alexandre vive, desde fevereiro de
2003, na cidade de Santarém, Estado do Pará, no meio da Amazônia Brasileira.
Ele sempre foi um homem pobre e sempre teve muitas dificuldades para realizar
os trabalhos da Editora Ogmios (Seaculum Obscurum). Entretanto, a partir de
2002, os estranhos livros que ele escreveu começaram a circular pelo mundo e,
em 2005, um site foi criado na Internet para comemorar os 21 anos da Editora
Ogmios (Seaculum Obscurum) e da Gravadora Arte Degenerada.
Estes
são os trabalhos feitos por Marco Alexandre Rosário na Editora Ogmios (Seaculum
Obscurum) – Gravadora Arte Degenerada:
- Poemas - (poesia/desenhos) - 1984.
- Um Conto Sobre a
Vida de São Francisco de Assis - (conto/pintura
- obra desaparecida) - 1985.
- Uns Dias na
Infância
- (conto infantil/desenhos) – 1985.
- As Cores -
(poesia/pintura) – 1985.
- As Flores -
(poesia/pintura) – 1985.
-.O Tecelão de
Paisagens
- (poesia/música/pintura) – março/1986.
- Sete Pérolas para
Hollandri - (poesia) – junho/1986.
- Surrealística I - (pintura – Obra desaparecida) – 1986.
- Iluminuras - As Iluminações que Rimbaud não Iluminou no
Jardim das Bonecas Manchadas de Sangue -
(poesia/música/pintura) – outubro/1986.
- Guirlanda de
Flores Sangrentas - (poesia/música/pintura) – fevereiro/1987.
- Surrealística II -
(pintura – obra desaparecida) – 1987.
- América Latrina
& o Gigolô Americano – (Poesia) –
1988.
- Invocações - (Poesia) – 1991.
- Amálgama – Uma Coleção de Obscenidades - (Poesia) – 1981-1992. Coletânea com
vários poemas.
- O Último Círculo de Pedra – (poesia/música/pintura) – (coletânea,
incluindo os melhores projetos musicais feitos entre 1981 e 1988) - 1994.
(estão inseridas algumas músicas feitas em 2002 e 2003).
- Surrealística III –
(Pintura) – setembro/2002.
- Surrealística IV –
(Pintura) – setembro/2002.
- Canções para Marina -
(poesia/música/pintura) – setembro/2003.
- Winona e as Cadeiras de Rodas – Compacto - (poesia/música) – outubro/2003.
- Winona e as
Cadeiras de rodas – álbum -
(poesia/música/pintura) – janeirol/2003 – julho/2005.
- New York–Paris –
(poesia/música/pintura) – junho/2004 - abril/2005.
OBS:
Texto escrito em 2002 (com acréscimos em 2005, 2008 e 2011).
EDITORA MORANGOS & UVAS
(SEACULUM OBSCURUM)
EDITORA OGMIOS
(SEACULUM OBSCURUM)
GRAVADORA ARTE DEGENERADA
SÉRIE BLITZBUCH
(1984 – 1993)
(2002-2011)
UNS DIAS NA INFÂNCIA
1ª EDIÇÃO: 1985
1 exemplar.
(Marco Alexandre. Belém, Pará, Brasil)
2ª EDIÇÃO: 2005
1 exemplar.
(Marco Alexandre. Belém, Pará, Brasil)
“Tudo
o que é esquecido
permanece
em sonhos obscuros do passado...
ameaçando
sempre retornar.”
(Velvet
Goldmine)
Editora Ogmios
(Seaculum Obscurum)/Gravadora Arte Degenerada:
Website:
www.seaculumobscurum.com
e-mail:
editoraogmios@yahoo.com.br
[1]
Chanterfields eram os trovadores dos quadrados que narravam os feitos heróicos
de seus reis.
[2] El Rey.
Composição de Gerson Conrad e João Ricardo. Secos & Molhados, 1973.
[3] All Together Now. Composição
de John Lennon e Paul McCartney. The Beatles, 1968.
[4] Strawberry Fields Forever. Composição
de John Lennon e Paul McCartney. The Beatles, 1967.
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